Lei portuguesa permite retirada de crianças do ambiente familiar sem aviso prévio
A falta de conhecimento sobre a legislação portuguesa de proteção à infância pode levar imigrantes a situações inesperadas e impactantes. Em Portugal, a retirada de menores do convívio familiar pode ocorrer sem aviso prévio em determinados casos, desde que respeitados os direitos da criança e dos pais.
O caso do casal brasileiro Carol Archangelo e Carlos Orleas, residente em Viseu, ganhou notoriedade entre a comunidade imigrante. Eles denunciaram que seus filhos foram retirados de casa sem qualquer notificação antecipada pelas autoridades portuguesas. A situação gerou grande repercussão, inclusive com o apoio de figuras públicas, como a atriz Luana Piovani, que sugeriu a realização de um protesto para sensibilizar as autoridades.
Proteção infantil em Portugal
Assim como no Brasil, Portugal adota o princípio do superior interesse da criança e possui um arcabouço legal específico para sua proteção. A Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo (Lei n.º 147/99, de 1 de setembro) regulamenta as intervenções do Estado sempre que a segurança, saúde, educação ou desenvolvimento de um menor esteja ameaçado.
Em situações de risco iminente, as autoridades podem determinar a retirada imediata da criança sem aviso prévio. No entanto, essa medida precisa ser fundamentada, proporcional e garantir o direito ao contraditório e ao acesso à informação por parte dos responsáveis.
A advogada Anna Luiza Pereira, especialista em Direito Internacional da Família e proteção de imigrantes em Portugal, explica que muitos brasileiros se surpreendem com a agilidade e rigor do sistema português. No Brasil, a atuação do Conselho Tutelar é mais demorada e geralmente relacionada a contextos de vulnerabilidade socioeconômica. Já em Portugal, o processo é mais técnico, preventivo e psicossocial, podendo envolver famílias de diferentes perfis socioeconômicos.
Como funcionam as investigações?
Sempre que há uma denúncia de risco para uma criança — que pode ser feita por qualquer pessoa a órgãos competentes, como entidades de proteção infantil, autoridades policiais ou judiciais — a família é notificada para um processo de avaliação que pode envolver:
Vistorias no ambiente familiar, inclusive nas residências de pais separados;
Entrevistas com profissionais, como professores, médicos e assistentes sociais;
Análise da conduta dos pais e do relacionamento com a criança;
Relatórios psicológicos e clínicos, podendo incluir avaliações psiquiátricas e toxicológicas.
Apesar da prioridade ser a proteção da criança, o sistema deve garantir transparência e respeito aos direitos dos pais. Segundo a advogada, é essencial que imigrantes conheçam o funcionamento da legislação portuguesa, especialmente em contextos de separação, conflitos familiares ou dificuldades emocionais das crianças.
O que fazer se for acionado pela CPCJ?
As Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) atuam com base nas normas e valores portugueses, que podem diferir da cultura brasileira. Questões como conflitos familiares, exposição nas redes sociais e bem-estar emocional da criança são analisadas criteriosamente.
Caso uma família seja contactada pela CPCJ, a orientação é:
Manter a calma: ser chamado pela CPCJ não significa que a guarda será perdida;
Cooperar: apresentar documentos e comparecer às reuniões;
Buscar assistência jurídica: para entender melhor os direitos e obrigações;
Demonstrar comprometimento: estar disposto a fazer ajustes para garantir o bem-estar da criança;
Solicitar apoio jurídico gratuito: caso não tenha condições financeiras, é possível recorrer à Ordem dos Advogados.
Direitos dos pais caso ocorra a retirada do menor
Se a remoção da criança for determinada, os responsáveis têm direito a:
Ser informados sobre o órgão responsável, os motivos da decisão e o paradeiro da criança (se está em acolhimento familiar ou institucional);
Acessar o processo e apresentar defesa;
Solicitar revisão das condições familiares, com novas provas e testemunhas;
Pedir reavaliação da medida aplicada;
Manter contato e visitas, conforme previsto no acordo estabelecido.
No caso de imigrantes, é recomendável que os pais procurem o consulado do seu país. O Brasil conta com representações diplomáticas em Lisboa, Porto e Faro, responsáveis por diferentes regiões de Portugal.
A advogada reforça que, para evitar surpresas desagradáveis, é essencial que as famílias estrangeiras compreendam as normas locais e estejam preparadas para eventuais intervenções das autoridades. Informação e mediação são ferramentas fundamentais para a prevenção de conflitos e proteção dos direitos das crianças e dos pais.